Disseminação

DeCode/M na COP25 - Madrid

By 10 de Dezembro, 2019 Abril 7th, 2020 No Comments

Participação na COP25 Madrid e na Cumbre Social por el Clima:

De 6 a 8 de dezembro de 2019, juntei-me a um grupo de 250 ativistas sociais e ambientais Portugueses que viajaram até Madrid durante a COP25 (2 a 13 de dezembro) como parte do movimento global contra as alterações climáticas. O grupo participou na marcha de sexta-feira, dia 6, que reuniu 500.000 pessoas de todo o Mundo para protestarem contra a inação dos governos e elites políticas no contexto da emergência climática, e esteve presente na Cumbre Social por el Clima durante o fim-de-semana.

A Cumbre Social por el Clima (6 a 13 de dezembro) é uma cimeira alternativa, organizada com o propósito de dar voz aos povos indígenas que não são ouvidos durante a COP oficial, e de criar um espaço para o estabelecimento de redes e alianças internacionais entre ativistas sociais e ambientais focados na justiça climática e social. A igualdade de género e o papel de homens e mulheres no movimento climático global foi um tópico muito presente durante a Cumbre, sendo bem sabido que, apesar de serem frequentemente ignoradas ou excluídas de posições de liderança, as mulheres são atoras centrais na luta contra as alterações climáticas.

A organização da Cumbre refletiu esta preocupação na forma como colocou as mulheres nas linhas da frente da ação ambiental à frente e ao centro durante várias das sessões que realizou, e durante as assembleias plenárias que tiveram lugar ao final de cada dia. O programa da Cumbre, com todas as atividades e sessões que tiveram lugar, pode ser consultado aqui.

Durante o fim-de-semana, participei em dois eventos de particular interesse para a área temática Ambiente e Alterações Climáticas: a 7 de dezembro, uma conferência e workshop sob o título “”Women’s Earth and Climate Action Network International – Frontline women protecting and defending rights, land, communities and climate”; e a 8 de dezembro, um encontro na Minga Indígena (um espaço permanente na Cumbre, onde os povos indígenas podem partilhar as suas histórias e experiências) intitulado “Pueblos indígenas en aislamiento voluntario, acceso a recursos naturales y servicios en el nuevo contexto climático”. Embora nenhum destes eventos tenha tido um foco específico nas masculinidades, em ambos foram feitos comentários repetidos à necessidade de reconhecer a importância das mulheres no ativismo ambiental e de criar alianças mais fortes entre mulheres e homens no movimento ambiental.

As e os representantes de povos indígenas salientaram como as mulheres nas suas comunidades estão a assumir a liderança da sua resistência contra projetos extractivistas que ameaçam os seus lares ancestrais e a sua subsistência, e como os homens (embora – com algumas exceções – sejam os líderes oficiais das comunidades) estão a aceitar este papel e a progressivamente permitir a transformação das dinâmicas de género nos seus lares e processos de decisão. Um bom exemplo seria o da AMWAE (Asociación de Mujeres Waorani de la Amazonía Ecuatoriana), um grupo de mulheres que se juntaram para resistir à apropriação, exploração e destruição dos seus territórios na Amazónia Equatoriana. Torna-se assim claro que as alterações climáticas estão a afetar papéis de género, feminilidades e masculinidades ao criar condições nas quais a igualdade de género é fundamental, em que é requerido aos homens que dêem mais espaço às mulheres para expressarem as suas opiniões e para defenderem as suas causas comuns, à medida que as mulheres assumem um papel de protetoras da Terra, dos seus lares originais e famílias e da sua cultura indígena.

Numa nota mais pessoal, participar na marcha de 500.000 pessoas de sexta-feira foi uma experiência interessante no que diz respeito ao género: a maior parte dos e das ativistas, cooperativas e pessoas com quem partilhei ideias sobre o movimento de justiça climática e social mostrou uma forte preocupação com a igualdade de género, independentemente de serem mulheres ou homens. Todos os homens com quem tive a oportunidade de falar foram muito vocais acerca da importância de ouvir as vozes das mulheres e aceitar o potencial e soluções que elas podem trazer para a mesa, sendo que estas são muitas vezes extremamente valiosas para a luta comum contra as alterações climáticas. Também reconheceram como estruturas patriarcais a nível institucional, social e cultural têm dificultado uma resposta positiva e concertada à emergência climática (e são, a muitos níveis, uma das principais causas do problema), por isso exigindo uma posição anti-patriarcal e equitativa muito clara em termos de género, classe, etnia, etc.

No contexto das alterações climáticas, é extremamente importante reconhecer e explorar as formas pelas quais padrões hegemónicos e tóxicos de masculinidade (como a petro-masculinidade ou a masculinidade industrial de líderes políticos poderosos como Donald Trump ou Jair Bolsonaro, como estudadas por autores como Cara Daggett ou Martin Hultman) estão a ser confrontados com novos tipos de masculinidade (e.g. masculinidades cuidadoras), que reconhecem a importância da igualdade de género e assim contribuem para a transformação de papéis de género em determinados espaços geográficos e culturais, de modo a desenvolver estratégias mais eficazes contra a emergência climática.

O modo como os media retratam e descrevem as alterações climáticas também não é neutro em relação ao género, razão pela qual existe uma séria e muito atual necessidade para se desenvolver uma análise crítica de como os conteúdos mediáticos refletem as dinâmicas de género da emergência climática e dos movimentos ambientais e sociais. Esta análise de representações mediáticas de masculinidades e dinâmicas de género no contexto da emergência climática está a ser explorada na área temática do DeCode/M – Ambiente e Alterações Climáticas.

Carlota Houart (DeCode/M)